Este fim–de–semana um homem aproximou–se de mim enquanto eu aproveitava os últimos raios de sol numa esplanada e pediu–me uma esmola. Explicou–me que só precisava do suficiente para um bilhete de comboio para voltar para casa. É romeno, tem quatro filhos e não tem trabalho. E é engenheiro agrário. Dei–lhe os poucos trocos que tinha e tudo o mais que pude fazer foi desejar–lhe boa sorte.
No mesmo fim–de–semana em que surgiram na imprensa novas notícias sobre a exploração de trabalhadores portugueses em países tão civilizados e tão europeus quanto a Holanda, é caso para perguntar o que, afinal, nós, mundo ocidental capitalista, dito civilizado e democrático, temos para oferecer. Aos cidadãos–comuns, àqueles que estão na trincheira das cidades, das empresas, postos públicos, nas filas de espera de centros de emprego, segurança social e hospitais não muito, na verdade. O que acenamos diante da prole é tudo aquilo que é irrisório parente a necessidade de um homem alimentar os seus quatro filhos, são os electrodomésticos, as roupas de marca, os leitores portáteis de mp3, os telemóveis de n–ésima geração e os automóveis velozes. E fazemo–lo confiantes de que isto é a verdadeira democracia. A democracia já não é o livre pensamento nem a livre escolha dos nossos governantes mas sim a livre escolha de produtos em escaparates de supermercados e similares.
Nós trocamos a vida dos nossos semelhantes pelo direito ao luxo e pela crença de que um dia teremos direito aos nossos quinze minutos de glória. Fazemo–lo porque o luxo não é compatível com um estado social: o mundo capitalista vive muito acima das suas capacidades, como se pode comprovar pelo aumento da inflação, do endividamento e da necessidade de se obter um crescimento económico apreciável para que ainda consigamos ser sustentáveis. Não abdicamos do luxo em prol do investimento, da criação de emprego nem da manutenção de um estado que consiga salvaguardar o bem–estar da maioria, incluindo o dos imigrantes de quem tanto dependemos. Quanto muito, manifestamo–nos quando as filas dos hospitais são já incomportáveis, como se estivéssemos à espera que a riqueza necessária para manter os serviços públicos essenciais caísse das árvores. Para tal, há que pagar impostos e cobrar mais aos ricos, para quem muitas leis são feitas por corrupção e favorecimento, e que claramente preferem mudar de carro a empregar mais um trabalhador quando os lucros sopram de feição. No nosso país é flagrante como os empresários preferem lanças opazinhas uns aos outros a criar sucursais, investir no estrangeiro e a permitir carreiras de sucesso aos seus trabalhadores.
E nós, clamamos por justiça, ou no fundo invejamos aqueles a quem a injustiça social mais favorece?